A
SAGA PELO SERTÃO COM SEUS ENCANTOS E MISTÉRIOS
Por
Armindo Maia Neto
Os
encantos, a tradição e história de Araxá a tornaram parte integrante do
Circuito Turístico da Serra da Canastra, conhecido hoje em todo o País. Também
não é por menos, a região é de uma beleza de tirar o fôlego. E o seu maior
atrativo é o Parque Nacional da Serra da Canastra, criado em 1972 para proteger
as nascentes do rio São Francisco. Além de Minas Gerais o rio percorre ainda
mais quatro estados até desaguar no mar. Os sertanejos lhe deram o apelido
carinhoso de “Velho Chico”, pois esse rio faz parte da ocupação do sertão.
Desde o século 16 suas águas constituíram em estrada para a colonização
brasileira.
É a partir daí que nossa viagem começa, e que
tal contar isto num filme. O cenário já esta criado: os cerrados com seus
vastos espaços, suas paisagens magníficas e de uma beleza singular. Vêm depois
as pessoas, as plantas e os animais que ali habitam, com sua história e cultura
muito próprias. E é isto que o diretor Glayer França Jordão e o produtor Paulo
Murilo Fonseca, ambos de Araxá, pretendem mostrar em documentário e levar sua
exibição para a TV a nível nacional. É algo assim como a saga que narra a
conquista da civilização pela nação brasileira.
O projeto de Glayer “A Invenção do Sertão”,
foi aprovado e tem o apoio do Ministério da Cultura, por meio da Lei de
Incentivo Cultural. Além da região de
Araxá e a Serra da Canastra, a produção contempla ainda os sertões de Guimarães
Rosa descritos no romance “O Grande Sertão: Veredas”; o norte de Minas, com o
Parque Nacional do mesmo nome, na divisa com o estado da Bahia, com um
imponente chapadão e verdejantes veredas, verdadeiros oásis em meio à paisagem.
Vamos dar um pulo também pelo sertão da Bahia, na região de Canudos e no Raso
da Catarina, que é uma Área de Proteção Ambiental. A produção quer registrar
ali de bem perto a arara-azul-de-lear e sua luta de resistência junto com o
sertanejo para sobrevier numa terra árida, mas com paisagens e histórias
encantadoras.
Esta
relação do homem com a natureza é parte também do roteiro. E o fantástico
lobo-guará é outro animal que caracteriza bem esse sertão mítico. Este que é
certamente um dos mais bonitos e misteriosos animais da fauna brasileira está
metido até a ponta do rabo em lendas e mitos pelo interior do País. Até hoje,
acredita-se que os lobos são criatura místicas, tem o olhar mágico, capaz de
hipnotizar. Na literatura foi eternizado nos contos de Guimarães Rosa.
Segundo Glayer coube ao escritor, num
formidável golpe de mestre, o papel de ampliar o significado dos vastos espaços
do cerrado e criar essa mitologia nacional. Aí é que se encontra o sertão. O
lugar passou então a ser povoado de sons e lendas. Rosa confrontou a tradição
arcaica dessa região com a vanguarda da literatura e filosofia ocidental. A
música do maestro Villa-Lobos nos remete em alma a este encontro, Tom Jobim
também ficou encantado com o sertão de Guimarães Rosa e passou a traduzir os
sons que ouvia trazendo-os para o seu disco Matita Perê.
GUIMARÃES
ROSA E A CULTURA
Sendo
assim o documentário irá mostrar o sertão, como a nossa paisagem afetiva, o
sertão como possuidor de uma brasilidade particular, intensa e bela. Enfim,
como as artes visuais, a música e a literatura, por meio de seus criadores, viram
e retrataram o sertão como um espaço mítico, onde podia ser encontrado aquilo
que era mais verdadeiro no Brasil. É o sertão como a nossa paisagem afetiva,
possuidor de uma brasilidade particular, intensa e muito bonita. No roteiro o
sertão é retrato não apenas como uma questão geográfica. Certa vez Guimarães
Rosa declarou: “levo o sertão dentro de mim e o mundo em que vivo é também o
sertão”.
Glayer que já conhece os Parques Nacionais no
Estado de Minas, parte de nosso sertão, é um apaixonado pela obra de Guimarães
Rosa e diz que o projeto é um sonho antigo. Então nada mais oportuno que o seu
reconhecimento pelo Ministério da Cultura. A pesquisa e uma pré-produção já
teve início. Agora, o que ele e todos os
envolvidos neste projeto precisam é captar recursos para produção em si e sua
realização.
Ao
final da produção, os realizadores irão exibir o documentário nas comunidades
onde serão feitas as filmagens, dando continuidade ao projeto que é também
educativo. Com os estudantes, tanto de Araxá como das demais regiões, serão
realizadas oficinas de como se produz um vídeo documentário, mas principalmente
despertar nos jovens o amor pela natureza e o interesse pelas espécies da fauna
e flora ameaçadas.
Mas além da luta em prol de uma ou duas
espécies em risco de extinção, ao conversar com Glayer percebo em seu projeto
uma causa muito maior. Vejo um desejo de preservar a cultura, os costumes que
fazem parte de nossa história e ideais. É o sertão como depositário do passado
da sociedade. Como memória, pode mesmo constituir numa ameaça e deve ser
derrotado, literal e simbolicamente? Mas, ao apreciar iniciativas assim e ver
tanta paixão por uma causa, tenho certeza de uma coisa: o Sertão é um reino
(ainda) a encantar e a ser decifrado por todos nós brasileiros. Imagino que a partir daí, ao visitarmos uma
regiãodos cerrados, reduto deste sertão, veremos que ainda é possível viver
aventuras e descobrir segredos.
E
quem sabe um diavocê juntamente com seus habitantes, seja capaz de decifrar sua
linguagem. E até lá, num próximo passeio, simplesmente dando asas à imaginação
o sertão possa então lhe contar histórias incríveis, cheias de encantos.
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"A beleza aqui é como se a gente a
bebesse, em copo, taça, longos, preciosos goles servida por Deus. É de pensar
que também há um direito à beleza, que dar beleza a quem tem fome de beleza é
também um dever cristão."
Guimarães Rosa /Grande Sertão: Veredas
Jornalista Armindo Maia
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