Daqui exatamente 25 dias, Henrique Avancini viverá um dos momento mais importante da carreira. No dia 26 de julho, o atleta, do Time Ajinomoto, vai representar as cores verde e amarela em Tóquio 2020, em busca da inédita medalha. O semestre anterior aos Jogos, no entanto, não foi tão bom quanto esperado, o que forçou o líder do ranking mundial a tomar uma difícil decisão: dar um passo para trás para reencontrar seu melhor nível.
Henrique Avancini disputou duas etapas da Copa do Mundo neste ano. Na primeira, terminou o cross country em 10º lugar. E na segunda, na mesma pista onde foi campeão no ano passado, ele ficou apenas em 23º, a primeira vez que ele não esteve no top 20 de uma Copa do Mundo em quatro anos. Por isso, ele optou por não disputar as duas etapas seguintes, as últimas antes de Tóquio 2020, para voltar ao Brasil e se reconectar consigo mesmo. Assim, Avancini passou as duas últimas semanas isolado em Petrópolis e o resultado não poderia ser melhor.
“Quando você está bem, no flow, e está entregando, é um bom ambiente de estar [nas competições]. Você constrói cada vez mais confiança. Se você compete sempre e ganha sempre, você está batendo na confiança dos outros também. E eu não estava vendo isso acontecer comigo. Eu não estava seguro do que estava fazendo, não estava sentindo que as pessoas à minha volta estavam alinhadas”, explicou Henrique em entrevista exclusiva ao Olimpíada Todo Dia.
“E aí eu dei um passo para trás para reorganizar. Pedi liberação para o time para não competir, abrindo mão de pontos e tudo mais. Tive que tomar uma decisão difícil, porque é muito difícil para um atleta não competir. Mas eu precisava disso e estou muito tranquilo em relação ao que estou fazendo. Por mais absurdo que possa parecer para alguém, não me importa. Isso está me trazendo confiança e estabilidade”.
Pressão interna versus externa
Henrique Avancini teve um 2020 histórico. Superando todas as adversidades de uma pandemia, ele foi à República Tcheca e conquistou o inédito título da Copa do Mundo de mountain bike, se tornando o líder do ranking mundial posteriormente. É nesse momento que um trabalho psicológico bem feito faz toda a diferença.
“As pessoas começam a te projetar em um patamar que elas entendem ser o seu nível e acham que você precisa atender essa expectativa. Mas a minha cobrança interna é sempre maior. Isso é um dos pontos mais cruciais para um atleta de alto rendimento em esporte individual. Não dá para comparar a minha pressão interna com a das outras pessoas. Tem impacto? Tem, mas vai muito do seu equilíbrio interno. Não é uma coisa que vai me esmagar”.
“Entra sempre a parte de preparação mental, envolvida com os treinamento em si. E tudo constrói ou destrói a mente. Então é sempre o processo de estar se enchendo de alguma coisa e se esvaziando de outras. São ciclos que você precisa estar em muito equilíbrio para saber como e quando fazer”, completou.
Pequenas e valiosas lições
As vitórias trazem muitas glórias, mas as derrotas carregam com si muitos aprendizados. E mesmo com 32 anos de idade e uma carreira já longa, Avancini não se fecha para novas experiências. E por isso, ele tirou lições valiosas desse começo de temporada abaixo do esperado.
“A bike, e o esporte como um todo, sempre me ensinou que estamos em um aprendizado sem fim. Às vezes viver as mesmas situações não significa que elas sejam iguais. A diferença, que talvez pese a meu favor, é que eu tento me manter muito aberto ao novo, usando meus conhecimentos para continuar passando por novas experiências. E independente do começo do ano ter sido uma baixa, me trouxe muitas lições, em coisas pequenas, não no óbvio."
Uma dessas lições foi a importância de se reconectar com ele mesmo e com aquilo que vinha dando certo desde o começo. “Eu sempre falo que o maior crédito quando eu conquisto alguma coisa é meu, e a maior responsabilidade quando dá errado também é minha. Então precisei voltar a fazer coisas como eu acredito que devem ser feitas. Quando a gente vai crescendo, muita gente vai se apropriando do que você é, do que pode falar, fazer… Mas eu cheguei onde cheguei sendo quem eu sou. E falei: tenho que dar um tempo, porque estou me perdendo de mim. E se isso acontecer, eu não vou entregar o meu melhor e não vou ser eu quem eu acho que tenho que ser nas pistas e fora delas”.
No melhor nível antes de Tóquio 2020
Essas lições e a experiência levaram Henrique Avancini a um novo patamar. “Eestou me sentindo em ascensão de novo. Não sei o que isso vai refletir, como isso vai ser transmitido nas performances na pista, o que vai gerar em resultado. Mas eu me sinto performando em um nível que eu não sei se já experimentei. Isso eu estou falando de percepção, não de número, tempos… Mas o jeito como eu estou me sentindo”.
Mas se o nível está aumentando, a ansiedade vai pelo caminho contrário, diminuindo conforme Tóquio 2020 vai chegando. Eu estou cada vez menos ansioso e é bom se sentir dessa forma, porque parece que tudo a sua volta contribui. Sabe aquela coisa de quando você está voltando de uma viagem de muito tempo e você chega em casa? Traz alegria, mas você não sai gritando, não fica na euforia… Você fica sereno, calmo. E eu estou me percebendo assim, parece que estou indo para casa”.
A viagem para Tóquio está marcada para o dia 18 de julho. E partir daí, vai ser história. Para ele e para o Brasil. “Eu não tenho muita expectativa, não fico pensando em como vai ser. Estou vivendo muito os meus dias de forma integral e intensa e tem sido muito bom. Eu sei que minha realidade está cada vez melhor e isso que importa”.
“O que uma medalha em Tóquio 2020 significa para mim é que significaria muito para o ciclismo brasileiro. Se eu for falar como Henrique Avancini atleta, eu consegui construir o que eu almejava, uma carreira consolidada, respeito mundial. Então individualmente eu conquistei o que conquistei. Mas eu sei que isso [a medalha] é uma coisa que falta para a bicicleta no Brasil, não só para o ciclismo. E sei o peso e alcance que isso traz. Então é exatamente isso que significa. Significa para mim o quanto significa para a bike no Brasil”, concluiu.
fonte: Fernanda Zalcman
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